DIA DO TAXISTA



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Sou vidrado num táxi

      Não resisto ao prazer de passear nesses automóveis dos outros.
Fico desolado quando vejo filas quilométricas de táxis estacionados, à espera de passageiros, parecendo colossais anacondas sonolentas. Gostaria que os táxis estivessem permanentemente ocupados, com usuários em abundância para servir.

   Considero esses profissionais verdadeiros heróis do nosso quotidiano; enfrentando o caos organizado do trânsito, a imprudência dos pedestres, a incompreensão dos guardas multadores e a árdua competição dos demais companheiros.

      Sou costumeiro usuário dos serviços de táxis. Por isso, inebria-me a emoção de mergulhar, de vez em quando, neste mundo anônimo, ao mesmo tempo íntimo e acolhedor, sob cuidados de experientes profissionais.

    Para eles, pouco importam as previsões metereológicas e os atropelos que os esperam no trabalho diurno ou noturno. Tampouco, importa o destino das corridas que fazem; bem como que tipo de passageiro lhe faz companhia. Às vezes, um executivo cheio de frescurites, ou o cidadão comum preocupado com o preço do feijão e com a “coisa da coisa”.

  Zelosos, competentes, espirituosos, galantes, eufóricos e prestativos, nossos motoristas de táxis são uma valorosa categoria “prêt-à-porter”. Admiro-os por serem idealistas e ecléticos. Capazes de acumular e decodificar grandes quantidades de sinais do trânsito, ruas, bairros, regulamentos, códigos, proibições e ainda viver de olho vivo nas emboscadas dos guardas e dos radares: prontos para o bote.

   Com incrível facilidade os motoristas de táxis entabulam conversações com os passageiros, como se fossem velhos amigos; transformando as corridas em mini-jornais ambulantes, ou agradáveis devaneios filosóficos, a respeito de tudo e do nada. E como é agradável viajar com motoristas bem vestidos, bem barbeados, atualizados, cordiais e confiáveis. Desses que perfumam os veículos, colocam alguma coisa à disposição dos passageiros, revelando tais atitudes humanas a alma e a personalidade do dono.

    Conheci taxistas verdadeiras enciclopédias falantes, aptos a pegar carona em qualquer tipo de  conversa e até dar pitacos nos assuntos particulares dos passageiros. Eles fazem questão de saber e entender de tudo; especialmente de política, futebol, custo de vida e violência urbana: coisas que deixam qualquer motorista em pé de guerra. Cada qual tem seus “causos” para contar. Falam de suas aspirações e frustrações e nunca escondem a decepção com os políticos. Criticam tudo que está errado, com ardor e revolta.

      Andei com motoristas expressivamente místicos que  gostam de cultuar imagens de santos e orixás protetores, crucifixos, frases jocosas ou  bíblicas do tipo: “CRISTO SALVA”, “DEUS É AMOR”, “JESUS”, “O SENHOR É MEU PASTOR”, “PAZ E AMOR”: como importantes amuletos para espantar o demônio e os olhos gordos dos invejosos. A maioria deles acredita em Deus e na pureza dos ensinamentos de Jesus Cristo e são convictos seguidores da espiritualidade evangélica.

      Andar num táxi é um barato! Dentro deles podemos sentir-nos Reis, magnatas ou passageiros tão insignificantes, como uma galinha choca. Acho que todos os taxistas deveriam usar o crachá idenficador. São poucos os que declaram seus nomes ou se desejam saber dos nossos. No interior de um táxi reina um mundo quase totalitário, onde o motorista é o déspota absoluto, o guru místico, psicólogo metido, fanático crítico ou reclamador. Eles se julgam sempre donos da verdade e opinam sobre assuntos, tanto do meio onde vivem, como do que acontece do outro lado do mundo. Muitos se expressam como se fossem eloqüentes tribunos em campanha eleitoral.

   Alguns taxistas debulham rosários de lamúrias e queixas sentimentais, como se o mundo estivesse a pique. Outros pedem socorro psicológico, de “coração a coração”; pois, momentaneamente, motoristas e usuários formam uma perfeita parceria de confidentes e conselheiros. Às vezes, quando puxo conversa, basta um olhar reticente para entender que é melhor ficar calado.

     Aí, recolho-me à minha insignificância e passo a contar os postes que ficam para trás. Já encontrei motoristas mudos como múmias. Em compensação, já tive várias oportunidades de viajar com pessoas extrovertidas e animadas, que contavam   piadas, citavam livros de Cordel e os declamadores. Também encontrei taxistas cantores, de músicas populares e clássicas, que soltavam a voz como num concurso de auditório. Fiz amizade duradoura com um desses notáveis senhores, por questões profissionais. Pois,  três vezes por semana viajávamos juntos. Este foi fantástico. Só cantava canções com nomes de mulheres. Quando entrava no seu táxi, ele já me recebia alegremente cantando Célia. Depois, continuava com Diana,  Yolanda, Nanci, Emília, Amélia, Luciana, Mônica, Carmem, Marise, Gioconda, Roberta, Maria Elena, Adalgisa, Branca, Marina e outras, homenageando as mulheres. Romântico demais! Foi um tempo luminoso.

    Mas,  levando-se em conta os bons e honestos motoristas que encontramos, capazes até de dialogar sobre a Origem das Espécies, há também os chatos em pessoa, tão desprovidos de espontaneidade como o ator que esqueceu o texto; incapazes até de sorrir. Num universo tão heterogêneo como este, há os que são criminosos aproveitadores dos passageiros, especialmente nas estações de trens, rodoviárias e aeroporto das cidades grandes, onde chegam pessoas humildes e maltratadas pela vida. Elas são depenadas miseravelmente por motoristas de táxis inescrupulosos. O truque é este. Eles puxam conversa com a pessoa para sondar seu sotaque de origem e grau de instrução  Fazem várias perguntas para saber se o recém chegado conhece o caminho do destino da corrida. Então, se se trata de algum nordestino analfabeto lá das brenhas inóspitas do Nordeste ou de pessoa que não tem a menor idéia para onde vai, aí é aplicado o ardil, da corrida mais longa, da cobrança dos volumes transportados e do retorno para sua praça de trabalho.

     As mulheres taxistas. que não são muitas, são faladeiras, alegres,
prestativas, honestas. Outras são sisudas, trancadas, evitam diálogos, têm receios de cantadas dos passageiros espertinhos.
Mas são excelentes profissionais no exercício desta profissão, mais para homens.

    É uma lástima procedimento tão cruel. Porém, podemos confiar piamente, na integridade humana de 95% dos motoristas de táxis.
Diletantes, visionários, conformados, inconformados, alegres ou sisudos, os taxistas brasileiros, inclusive as poucas mulheres que enfrentam a difícil profissão são sentinelas à disposição da população. Indiferentes ao burburinho do mundo, eles cortam nossas ruas como flechas ligeiras, prestando inestimável serviço à sociedade. 

     Mesmo assim, a categoria de vez em quando, amarga derrotas, fruto dos assaltos impiedosos praticados contra essas criaturas dignas prestadoras de eficientes serviços, porém, indefesas no volante de um automóvel. Que nossos taxistas mereçam todo respeito e o brio que a sociedade deve e precisa lhes assegurar.

Dia do taxista - 05 de setembro

Autor Rivaldo Cavalcante

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